quarta-feira, 21 de julho de 2010





De madrugada, bateram à porta da farmácia com um homem gravemente ferido, vítima de alguma brutalidade da polícia. Érico Verissimo era filho do dono da botica e devia ter uns 14 anos, se tanto. Foi arrastado às pressas para segurar a lâmpada à cabeceira da mesa de operação num galpão no fundo do quintal. A primeira coisa que chamou sua tenção foi o polegar decepado, preso à mão esquerda do desconhecido só pelo tendão. Um golpe de adaga havia descolado parte do couro cabeludo. Mas o ferimento mais horripilante era um talho de navalha que rasgara a face do lábio até a orelha. "Naquela noite nasceu em mim o sentimento de justiça e repugnância pela violência. Continuei firme onde estava", contaria ele muito tempo depois."Tem-me animado até hoje a ideia de que o menos que um escritor pode fazer numa época de atrocidades, é acender sua lâmpada, fazer luz sobre a realidade de seu mundo, evitando que sobre ele caia a escuridão, propícia aos ladrões, aos assassinos e aos tiranos. Se não tivermos lâmpada elétrica, acendamos nosso toco de vela ou, em último caso, risquemos fósforos repetidamente, como sinal de que não desertamos nosso posto."

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